Monday, August 20, 2012

SAUDADES DO DR. ROBERTO


Todo o mundo sabe que eu sou o último dos liberais. No sentido antigo da palavra. Eu não sou um neo-liberal, por exemplo. O meu liberalismo é assim uma espécie de vale-tudo, menos os conservadores, que são nossos inimigos mortais. Eles estão para nós assim como o Escaravelho Vermelho estava para o antigo Batman. Hoje em dia virou bagunça e o inimigo do neo-Batman é o Coringa.
Tudo isto para dizer que O Globo, desta vez, exagerou. Na penúltima manchete eles acabaram com uma greve - a dos professores - que, apesar da profecia - vai bem, obrigado. Hoje, eles decretaram que "a greve", não sabemos exatamente qual, já custou 1,2 bilhão em sete anos. A princípio me perguntei: estamos em greve há sete anos? Depois, mais calmo, me dei conta da conta que eles fizeram, conta de mentiroso. Sete anos? porque sete anos? Poderiam ser dois, dez ou setenta. Mas para quem fez e autorizou esta manchete não faz mal. O importante é que "a greve", qualquer greve, já custou mais de um bilhão.
Perdoem-me os meus amigos de esquerda, mas eu já trabalhei em O Globo e ainda tenho bons amigos jornalistas, alguns ainda de esquerda, deste tempo. Na época em que lá trabalhava, na mesma sede onde fica parado o Dodge Dart do Agamenon, eu era o que se chamava de "Redator A" (ainda vou escrever um livro com este título. Redator A era mais importante que PhD em História, ou que Titular em universidade federal. Ao Redator A competia, entre outras coisas, escrever as manchetes. Se eu escrevesse uma manchete como esta, o Dr. Roberto Marinho, que ainda andava por entre as máquinas de escrever, teria me demitido.
Mas, eu sou um liberal vale-tudo e para mim vale a greve como vale ser contra a greve. Só não vale mentir, porque mentir é coisa de conservador. E a mentira não tem nuances. A mentira é a falta da virgindade. Não existe meia mentira assim como não existe a "demi-vierge". A melhor definição de demi-vierge que eu encontrei foi em um dicionário inglês: "a girl or woman who behaves in a sexually provocative and permissive way without yielding her virginity". Isto é o que se pode chamar de "demi-definition". Demi-vierge é muitíssimo mais do que isso, senão qualquer criança brasileira ou sueca, no carnaval carioca ou em um acampamento de escoteiro em Estocolmo, seria uma demi-vierge. Não, demi-vierge, a rigor, não existe. Porque ou se é virgem ou não, porque a virgindade é um estado de espírito, assim como a inocência.
Eu, quando vejo uma manchete como esta de O Globo de hoje, me sinto uma virgem, uma vestal, e vejo o quão longe vai a minha ingenuidade quando se trata de lidar com conservadores. Cheguei mesmo a pensar em me tornar "de esquerda" novamente. Depois desisti, primeiro porque a esquerda também já perdeu a vergonha e porque, como diria uma pessoa de quem eu gosto, esquerda e novo não combinam na mesma frase. Está bem, é "novamente", mais eu odeio advérbios, porque não são nem verbos nem adjetivos. Uma espécie de demi-vierge gramatical.
Mas paro estatelado quando leio o sub-título da matéria de O Globo: "professores das universidades federais estão chegando a mil dias de greve...em 32 anos". Os três pontinhos não existem, mas eu não resisti. Alguns, professores e não pontinhos, já morreram sem completar os mil dias de greve, esses são uma espécie de "demi-Pelé", o Romário que me perdoe.
Senhores jornalistas de todo o mundo: estes são títulos e sub-títulos que se prezem? Está bem, todos tem o direito de ser contra a greve, qualquer greve, mas um mínimo de caráter é necessário. Vou terminar, porque senão começo a falar bobagem. E por falar nisso, tenho saudades do Dr. Roberto.

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